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Como a alimentação pode ajudar a melhorar os sintomas do autismo

Nós do Pequeno Gourmet sabemos que a alimentação pode ser uma grande aliada para a saúde das crianças. E quando falamos das crianças com autismo essa também pode ser uma realidade. Para entender essa relação, conversamos com a Nádia Isaac, nutricionista clínica, doutoranda em ciências, mestre em ciência e tecnologia dos alimentos e autora de uma dissertação que relaciona os hábitos alimentares e a síndrome do espectro autista.

Pequeno Gourmet: Existem nutrientes que podem ajudar no tratamento do Transtorno do Espectro do Autismo?

Dra. Nádia Isaac: A suplementação de alguns nutrientes pode ajudar na melhora de determinados sintomas comportamentais do autismo. Alterações nos níveis sanguíneos de ômega- 3, por exemplo, têm sido relatadas em transtornos psiquiátricos, incluindo o autismo. Há evidências de que a suplementação do ômega-3 pode promover uma mudança significativa em sintomas dos autistas como hiperatividade, déficit de atenção e estereotipia de comportamento. É comum também observar a anormalidade da microflora intestinal nos autistas e uma flora intestinal ruim, que favorece a permeabilidade e contribui para os danos à saúde do interior do intestino e para a corrente sanguínea. Nesses casos, a suplementação com probiótico pode contribuir para o controle de sintomas gástricos e o aumento da imunidade hormonal.

Pequeno Gourmet: As crianças com autismo tendem a comer de forma mais rápida e em maiores quantidades? Por que isso acontece?

Dra. Nádia: Comer em excesso (hiperfagia) é comum em pessoas portadoras do transtorno do espectro autista. A causa desse comportamento ainda não é definida. Algumas alterações fisiológicas decorrentes de desequilíbrio hormonal na região do hipotálamo ou hipófise podem explicar esse comportamento. A ingestão compulsiva de alimentos e a saciedade não controlada são maneiras que o autista encontra para aliviar sua ansiedade e suas tensões. Quando falamos de crianças com autismo, as dificuldades em desenvolver amizades com colegas na escola podem, por exemplo, levar a sentimentos de isolamento e provocar a compulsão alimentar. Nesse caso, comer gera prazer e o autista quer conservar essa sensação mantendo o consumo de alimentos o maior tempo possível. Vale lembrar que muitos autistas, principalmente aqueles com deficiência cognitiva, podem não possuir habilidade de controle ou colocar limites sobre algo que gostam. Por outro lado, os pais também podem acabar incentivando essa compulsão quando procuram compensar o comportamento dos filhos oferecendo o alimento favorito das crianças. Isso provoca um círculo vicioso: os familiares, com o intuito de evitar conflitos na rua, oferecem alimentos quando a criança quer e reforçam o hábito da compulsão.

PG: As crianças autistas podem desenvolver mais facilmente a obesidade?

Dra. Nádia: Algumas pesquisas recentes relatam a maior ocorrência de obesidade associada a distúrbios metabólicos, como a diabetes melitus e as crianças autistas, quando comparadas com crianças em desenvolvimento típico. Com relação às crianças com Transtorno do Espectro Autista, podemos falar que a obesidade acontece por 4 fatores:

Níveis baixos de atividade física: alguns estudos mostram que as crianças com autismo se envolvem menos em atividades físicas. Isso acontece porque esses pequenos não costumam participar de esportes em equipe, quando optam por exercícios escolhem atividades mais solitárias como o ciclismo e a natação. A limitação dos níveis de atividade física estariam, principalmente atribuídas a deficiências motoras, comunicação social, sensorial e domínios comportamentais.

Má nutrição: os padrões nutricionais dos autistas podem ser afetados por três deficiências específicas: problemas com modulação sensorial (hipersensibilidade tátil, olfativa e gustativa, que provocam aversão a alimentos com certas texturas ou cheiros, e o consumo reduzido dos saudáveis), comorbidades gastrointestinais (constipação, desconforto abdominal, diarreia, refluxo e alergias alimentares e reações inflamatórias ao glúten e caseína) e a deficiências de comunicação social.

Ambiente familiar: o meio também pode influenciar nesses hábitos alimentares, com pais que incentivam dietas com alta densidade energética ou com o uso de reforçadores calóricos.

Uso de medicação e anormalidades metabólicas: para tratar os sintomas comportamentais ou psiquiátricos em crianças com autismo podem ser indicados medicamentos psicoativos, antipsicóticos, antidepressivos, drogas anti-ansiedade e estimulantes. E alguns fármacos como a risperidona pode levar ao ganho significativo de peso. Já os antipsicóticos podem ter a função de bloquearem a ação da serotonina (responsável pelo fator de saciedade do cérebro) e dessensibilizar a leptina (reduzindo a sensibilidade do centro da saciedade), o que provoca aumento de apetite e ganho de peso.  Os desequilíbrios fisiológicos e metabólicos em pessoas com autismo também contribuem para obesidade. Com destaque para os hormônios pró-inflamatórios (a leptina, por exemplo, aumenta a massa de gordura e o IMC das crianças) e anti-inflamatórios (como fator de crescimento transformante beta-1 e adiponectina, que protegem o organismo dos distúrbios metabólicos). Em alguns estudos recentes foram mostrados maiores níveis de leptina em crianças e adolescentes com autismo e menores níveis de adiponectina, o que pode explicar a obesidade.

PG: Uma dieta isenta de glúten e caseína, pode ajudar as crianças autistas?

Dra. Nádia: Autistas podem ter uma deficiência de enzimas proteases. Essas enzimas conduzem a produção excessiva de peptídeos (pequenas proteínas) opioides derivados do glúten (trigo, cevada, aveia e centeio) e da caseína (leite) dentro do lúmen intestinal. Esse fato associado ao aumento da permeabilidade intestinal e de condições como a inflamação nessa região, presentes nos autistas, permite a passagem dos peptídeos opioides para a corrente sanguínea, o que provoca disfunções no sistema nervoso e agrava os sintomas do autismo. Assim, estudos relatam que, com uma dieta isenta de glúten e caseína, há uma melhora dos autistas no que diz respeito ao progresso da conduta em sociedade, atenção, concentração, integração e interação, percepção da dor, coordenação motora, hiperatividade e redução da frequência de autoagressão.

PG: Como deve ser esse processo de exclusão do glúten e caseína para os pais que optam por isso?

Dra. Nádia: A dieta deve começar a partir da exclusão de caseína, com a eliminação do leite e seus derivados. O tempo considerado adequado para a conclusão dessa etapa é de três semanas. Para a restrição do glúten é necessária a eliminação de diversos cereais (trigo, cevada, aveia e centeio) e alimentos que contenham o glúten oculto como macarrão, pães e biscoitos. Para essa etapa, o mínimo estipulado é de três a quatro semanas. Os benefícios da eliminação da caseína podem ser observados rapidamente, dentro de dois a três dias em crianças jovens ou de 10 a 14 dias em adultos. Os sintomas da abstinência do glúten podem ser menos severos que da caseína, mas permanecem por mais tempo, o que explica o fato de se começar pela retirada da caseína. É importante lembrar que os pais que optarem por uma dieta isenta de caseína e glúten devem procurar orientação de um profissional nutricionista, devidamente capacitado, já que essa é uma dieta muito restritiva. Algumas pesquisas relatam que autistas que têm uma dieta restritiva podem ter prevalência de deficiência de aminoácidos essenciais e baixos níveis de triptofano. O desenvolvimento inadequado de ossos também foi observado em um grupo de autistas que consumiu essa dieta.

PG: Existem mais casos de seletividade alimentar entre os autistas?

Dr. Nádia: A seletividade alimentar está em 80% das crianças com autismo e afeta mais os meninos do que as meninas. Algumas pesquisas mostram que esse comportamento nos autistas é superior ao de pessoas com desenvolvimento típico, crianças portadoras de Síndrome de Down e com paralisia cerebral. A seletividade alimentar é frequentemente relacionada à ingestão inadequada de nutrientes e risco de deficiências nutricionais, podendo estar associada com falha no ganho de peso. Em muitos casos, a seletividade se resolve, em outros, pode até ser um comportamento ritualista nas crianças com autismo, em que sempre se persiste nos velhos hábitos alimentares. Outra causa para essas crianças serem comedoras seletivas é o fato de que as pessoas com Transtorno do Espectro Autista são sensíveis a texturas, cheiros e aparência dos alimentos. Pode acontecer de a criança ter medo de caroços em seus alimentos, problemas com ingredientes que sejam moles ou a aceitarem a refeição só se as preparações estiverem separadas no prato, recusando a mistura de vários alimentos.

PG: Como os pais de crianças com autismo podem ajudar seus filhos a comerem de uma maneira mais saudável e com uma maior variedade de alimentos?

Dra. Nádia:  As crianças portadoras de autismo podem apresentar problemas comportamentais nas refeições como recusa alimentar, seletividade, variedade limitada de alimentos, especificidade na apresentação dos alimentos (exigirem sempre os mesmos utensílios e embalagens específicas, por exemplo) e comportamentos disruptivos (choros, gritos, agitação, agressividade e auto agressividade). A causa desses comportamentos está associada, na maioria dos casos, a combinação dos problemas emocionais e funcionais. Por isso, antes de tudo, os pais devem procurar uma avaliação clínica das crianças para identificar a possível existência de doenças ou alterações no trato digestório, alergias alimentares, hipersensibilidade, doenças dentárias ou problemas na deglutição (ao engolir).  Abaixo, estão algumas dicas para ajudar nesse momento, lembrando que cada criança é diferente e as famílias precisam ser criativas ao utilizarem essas estratégias:

Defina uma agenda de alimentação e rotina: peça ao seu filho que ele coma no mesmo lugar e siga o mesmo horário e rotina das refeições. Isso ajuda a criança a entender o que vai acontecer durante esse momento e o que você quer que ela faça.

Evite oferecer comida durante todo o dia: não permita lanches, comidas e bebidas durante todo o dia. Fazer isso diminui o apetite e a vontade de experimentar novos alimentos e o consumo do número de calorias totais. Reserve apenas cinco ou seis refeições programadas ao dia e limite o quanto seu filho pode comer em outros momentos. Para que isso funcione é preciso que toda a família também mantenha este costume.

Forneça assentos confortáveis e apoio: deixe a criança em uma cadeira alta ou em uma mesa de tamanho infantil, para que ela seja capaz de se sentar na vertical, evitando se inclinar ou balançar os pés. Um banco ou uma pilha de livros podem ser usados para apoiar o pé. Esta estabilidade promove bons comportamentos durante a refeição, faz a criança se sentir segura e diminui a distração.

Limite o horário das refeições: não torne esse momento muito longo, limite o tempo de 15 a 30 minutos para os lanches e refeições. E no final, retire todos os alimentos e permita que a criança volte para suas outras atividades.

Reduza as distrações: evite ambientes com algo que possa distrair a criança enquanto ela come e a alimente só quando ela estiver atenta e alerta.

Mantenha a criança envolvida: permita que o pequeno ajude com a seleção e criação dos alimentos para a refeição, mesmo que ele não prove o produto final.  Isso permite que ele explore e brinque com diferentes alimentos, sem a expectativa de ter que comê-lo.

Pratique comportamentos alimentares agradáveis e saudáveis:  faça das refeições momentos divertidos e não se concentre na criança. Evite ficar pedindo, implorando e persuadindo para que ele coma. Vale lembrar que as crianças aprendem observando, portanto, faça escolhas de alimentos saudáveis para toda a família e mostre para seu filho como você os escolhe.

Recompense comportamentos positivos: elogie quando a criança se aproximar ou experimentar novos alimentos. Ofereça recompensas imediatas como soprar bolhas de sabão ou um adesivo, que ajudam a incentivar a alimentação. Lembre-se que recompensar bons comportamentos, pode aumentar a probabilidade de eles se repetirem.

Ignore comportamentos negativos: quando possível, ignore a criança quando ela estiver fazendo coisas como cuspir, atirando objetos ou recusando a comida. É importante lembrar que você não quer incentivar esses comportamentos prestando atenção neles. Se esses comportamentos forem graves é melhor que sejam conduzidos por um especialista.

Lembre-se da regra de 3: é importante oferecer os alimentos que seu filho gosta e os que ele ainda não gosta. Uma boa regra é servir apenas alguns alimentos de cada vez, incluindo dois que ele gosta e um prato novo. Se a criança não tolerar o novo alimento no prato, coloque o novo ingrediente perto dele ou em um prato separado.

Apresentação: apresente novos alimentos em pequenas porções e de forma divertida, ou familiar para aumentar a possibilidade de seu filho prová-lo.

(As estratégias foram extraídas do documento “A Parent’s Guide to Exploring Feeding Behavior in Autism” produzido por Autism Speaks Autism Treatment Network / Autism Intervention Research Network on Physical Health communications department.)

PG: Alguma característica da criança ao se alimentar pode ser um fator decisivo para o diagnóstico de autismo?

Dra. Nádia: Uma grande porcentagem de crianças com TEA apresentam problemas de alimentação, mas nenhum comportamento alimentar está relacionado ao diagnóstico. As manifestações comportamentais que definem o autismo incluem déficits qualitativos na interação social e na comunicação, padrões de comportamento repetitivos e estereotipados e um repertório restrito de interesses e atividades.

 

 

 

 

Sobre o entrevistado
Nome: Nádia Isaac da Silva
Profissão: Nutricionista
Contato:

Consultório: (19) 30386782/ 37132865


Sobre:

Nutricionista CRN3 – 11.113

Nutricionista Clínica

Mestre em Ciência e Tecnologia de Alimentos

Doutorando em Ciência

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